segunda-feira, 14 de junho de 2021

 

Ti Piedade Ligeira

e a sua capacidade de desconcertar os letrados


 


A extraordinária mulher conhecida por Piedade Ligeira, natural de Vila Nova, tinha um dom que cultivou – rimar de improviso sobre qualquer situação, utilizando uma linguagem vernácula que desconcertava muitos letrados, que a provocavam para ouvir as suas respostas repentinas.

As suas rimas não foram registadas e, mesmo as que foram temporariamente retidas pela memória dos contemporâneos, acabaram por ser esquecidas, ou por partir com quem as guardava.

Até mim chegaram apenas três que vou tentar reproduzir embora censuradas, deixando ao leitor a tarefa de as reconstituir preenchendo com letras os espaços deixados em aberto.

1 – A cantar ao desafio com um cantor afamado, na romaria da Santa Eufémia, este avançou com a quadra:

Há sete anos sou casado

Sete mulheres conheci

E que Deus seja louvado

Ainda estou como nasci,

ao que a Ti Piedade Ligeira respondeu, deixando o adversário sem resposta:

 

Minha rica Santa Eufémia

Anda cá fazer justiça

Este homem é capado

Ou então nasceu sem p_ç_.


2 - A professora primária, Maria Céu Santos, sabendo da fama da Ti Piedade, desafiou-a a dizer uma das sua quadras “picantes”. Ela não se fez rogada:

Com M se escreve Maria

Com M se escreve Mulher

Com C se escreve C_r_l_o

Que é o que a senhora quer.

 

3 – Estando à porta dos Armazéns Lobo, o Dr. Bráulio Afonso que a conhecia bem, ao vê-la passar chamou-a: Ti Ligeira…

Foi de imediato premiado com uma quadra, à maneira de resposta:

 

Ouvi chamar “Ti Ligeira”

E virei-me de repente

Sou como a pele do C_r_l_o

Que anda pra trás e prá frente.

 

Assim deixava bem dispostos, e sem resposta, os letrados que a desfiavam.

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