Ti Piedade Ligeira
e a sua capacidade de desconcertar os letrados
A extraordinária mulher conhecida por Piedade Ligeira,
natural de Vila Nova, tinha um dom que cultivou – rimar de improviso sobre
qualquer situação, utilizando uma linguagem vernácula que desconcertava muitos
letrados, que a provocavam para ouvir as suas respostas repentinas.
As suas rimas não foram registadas e, mesmo as que
foram temporariamente retidas pela memória dos contemporâneos, acabaram por ser
esquecidas, ou por partir com quem as guardava.
Até mim chegaram apenas três que vou tentar reproduzir
embora censuradas, deixando ao leitor a tarefa de as reconstituir preenchendo com
letras os espaços deixados em aberto.
1 – A cantar ao desafio com um cantor afamado, na
romaria da Santa Eufémia, este avançou com a quadra:
Há sete anos sou casado
Sete mulheres conheci
E que Deus seja louvado
Ainda estou como nasci,
ao que a Ti Piedade Ligeira respondeu, deixando o
adversário sem resposta:
Minha rica Santa Eufémia
Anda cá fazer justiça
Este homem é capado
Ou então nasceu sem p_ç_.
2 - A professora primária, Maria Céu Santos, sabendo
da fama da Ti Piedade, desafiou-a a dizer uma das sua quadras “picantes”. Ela
não se fez rogada:
Com M se escreve Maria
Com M se escreve Mulher
Com C se escreve C_r_l_o
Que é o que a senhora quer.
3 – Estando à porta dos Armazéns Lobo, o Dr. Bráulio
Afonso que a conhecia bem, ao vê-la passar chamou-a: Ti Ligeira…
Foi de imediato premiado com uma quadra, à maneira de
resposta:
Ouvi chamar “Ti Ligeira”
E virei-me de repente
Sou como a pele do C_r_l_o
Que anda pra trás e prá frente.
Assim deixava bem dispostos, e sem resposta, os letrados
que a desfiavam.

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